Tudo tem seu tempo. Há um momento oportuno para cada coisa debaixo do céu”
(Ecl 3,1)
Serão lutos e perdas os aprendizados mais difíceis da vida?
Algum dia estaremos aptos para o sofrimento?
Segundo o escritor Evaldo Alves D’Assumpção, a morte é, sem dúvidas, nossa maior “perda”, pois não a entendemos como uma “transformação”!

Cabe a cada um identificar seu ciclo vital e elaborar lutos, perdas e ganhos. A perda poderá sentimentos de culpa, raiva, ansiedade e até depressão. Lutos e perdas oportunizam mudanças internas e externas e modificam a vida que perdeu e quem de quem partiu.
Em vez de negar as perdas, organize o luto com o coração, a mente e a vontade.
Pergunta-se qual o aprendizado desta lição na vida, atribuindo-lhe resposta de “significância maior”, além do que se vê, se ouve, se sente e se compreende.
Com fé liberta-se do banco da lamentação. Crer que o subjacente à perda-morte há o mistério nascimento-vida.
A vida é ritmada na cadência nascer, morrer, ganhar, perder, fazer, ser.
Cantar, dançar e chorar são capítulos da cartilha da vida.
No nascimento perde-se a morada no seio materno, corta-se o cordão umbilical. Separamo-nos. O choro do nascimento é o grito doído do pulmão aprendendo a respirar sozinho. Ganho escondido na intimidade da perda.
Ganhos e perdas entrelaçam-se. O sol perde o dia enquanto a lua ganha a noite. Eis o princípio da realidade.
ACEITAR O LUTO
Disse-me doloridamente a mãe, cuja filha doente morreu há um mês, deixando-lhe dois netos adolescentes órfãos, de 11 e 15 anos de idade: “Preciso deixar minha filha partir, descançar...”
A mãe sofrida, sentia saudade, tristeza. Chorava. Rezava pela filha, de 37 anos, dando-se conta que ela concluíra seu ciclo terreno. Já não voltaria para o café da tarde. Seu cotidiano jamais existiria. Seu sorriso, porém, seria mantido no porta-retrato e na memória afetiva da familiar.
A sonoridade de sua voz e de suas alegres risadas ecoava no coração auditivo dos filhos.
As mãos da mãe que afagava a filha ainda traziam impresso o sofrimento da dor física desta. E, neste luto, avó e netos vão compondo a nova realidade. Escrevem e registram com palavras de dor-amor na cartilha da vida a aceitação e o encerramento desta história.
A aceitação das perdas é a etapa determinante na elaboração do luto como realidade.
É preciso falar e chorar o luto! Conta-me a senhora viúva: “não quero chorar saudade, nem falar da falta que meu marido me faz. Meus filhos não suportam me ver triste e chorando”
Por que esconder as lágrimas que choram a perda?
Elas banham o rosto, lavando a tristeza do coração. Por que negas a fragilidade humana?
É ela que nos faz reconhecer a própria fortaleza, virtude concedida pelo Pai.
Eis um aprendizado: permitir-se colo, apoio, aceitando um lenço,amigo que segue as lágrimas. Revestir-se da modéstia, da singeleza, do deixar-se cuidas. Cuidas da vida também é cuidas do sofrimento, da vulnerabilidade, das perdas e lutos.
Autorizar-se falar do vazio, da saudade de quem partiu, é um jeito de se conscientizar de que a pessoa amada se encontra além do aqui e agora.
Falar da dor ameniza machucaduras. Falar é liberar, é sarar, e aos pouquinhos a paz, a mansidão e a paciência farão morada em sua cela interior.
Partilhar sentimentos de perdas, choros, tristezas torna-se um percurso terapêutico na cura da dor e reorganiza a vida após o luto.
VIDA TRANSITÓRIA
Com a perda da pessoa amada, permanecem lembranças no espaço da casa, nos momentos comemorativos, tais como aniversários, natal, ano-novo, páscoa. Aos pouquinhos vai reorganizando o vazio de seu espaço interior e exterior.
Na memória emocional e espiritual, permanecerão as lembranças de quem partiu. Seja forte e veja a necessidade de fazer remanejos e adequações na sua casa.
Com carinho e cuidado, repense sua forma de viver e seus projetos de vida. Aceite, partilhe, cuide-se!
A sabedoria do tempo estabilizará sentimentos e escolhas. Com benevolência e bondade, entregue ao Pai quem partiu.
Li algo comparando o tempo de vida com o tempo de piscar dos olhos. Anos vividos e segundo somente. Viver é conviver com a irmã morte
O educador, psicólogo e antropólogo Roberto Crema observa: a humanidade perdeu a dimensão do paraíso, da eternidade. Nega aos filhos o direito à frustração. Apresenta a eles um mundo maravilhoso, tipo “o paraíso é aqui”. Teme-se a fala do transitório, da eternidade.
Resta-nos alfabetizar a alma da humanidade. Precisa-se aceitar a impermanência e a finitude aqui, acreditando na permanência e na infinitude acolá.
CLEUSA THEWES
Assitente social, terapeuta familiar, especialista em Gerontologia,
Psicologia Transpessoal e Orientação familiar
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